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PASSOU DOS LIMITES: Olha só o que Lula disse de Bolsonaro

Brasília – Em meio a aplausos contidos e olhares atentos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) subiu ao palco do Palácio do Planalto nesta terça-feira (1º), carregando não apenas um pacote de financiamento bilionário para o agronegócio, mas também um recado afiado – com endereço certo, ainda que não declarado.

Sob o pretexto de apresentar o Plano Safra 2025-2026, que promete injetar até R$ 516 bilhões em crédito para médios e grandes produtores rurais, Lula aproveitou o microfone para disparar: “Nunca pedi PIX a ninguém. Nunca vou pedir anistia antes de ser condenado. Quem é frouxo, que não cometa bobagem.”

A frase, aparentemente genérica, veio carregada de contexto — e de pólvora. O alvo? Claramente seu antecessor, Jair Bolsonaro (PL), embora o nome do ex-presidente não tenha sido pronunciado. E é aí que o roteiro da política nacional ganha contornos de thriller.

Entre o campo e os tribunais

Nos últimos meses, Jair Bolsonaro tem estado no centro de uma verdadeira tempestade judicial. Réu no Supremo Tribunal Federal (STF) por suposta tentativa de golpe após as eleições de 2022, o ex-presidente tem buscado apoio em manifestações populares — e, não raramente, em doações via PIX feitas por simpatizantes que se solidarizam com suas despesas legais.

Além disso, atos pedindo “anistia” para os envolvidos no 8 de janeiro de 2023, quando bolsonaristas invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes, continuam sendo organizados, em parte com o apoio de Bolsonaro.

Lula, sem poupar insinuações, usou justamente esse pano de fundo para se distanciar de qualquer pedido semelhante. “Guardem o dinheiro para pagar os funcionários”, disse aos produtores. “Eu não quero PIX.” Um presidente que se apresenta como incorruptível, contrastando com um antecessor que, em suas palavras, recorre aos outros para pagar pelos próprios erros.

Missão estratégica: reconquistar o agro

Há, porém, mais em jogo do que provocações políticas. O discurso acontece em um cenário estratégico: o agronegócio, setor no qual Bolsonaro obteve vantagem esmagadora nas eleições de 2022. Lula sabe disso. E tenta, com discursos calculados e promessas de crédito facilitado, romper o bloqueio ideológico que o separa da base rural.

“Quero que provem que já teve um presidente mais decente com vocês do que eu. Esse governo aqui respeita o produtor rural”, afirmou. O pacote do Plano Safra, com juros subsidiados e reforço de apoio técnico, faz parte desse movimento.

Entre bravatas e números: o recado a Guedes

Mas as alfinetadas não se limitaram a Bolsonaro. Lula também encontrou espaço para sair em defesa do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, duramente criticado por opositores e parte do mercado financeiro. Em um comentário carregado de ironia, comparou Haddad a Paulo Guedes, ministro da Economia do governo anterior.

“Poucos países têm um ministro com a seriedade de Haddad. O Guedes fazia bravata atrás de bravata. Ninguém cobrava responsabilidade fiscal naquela época. Agora querem cobrar tudo”, disse.

Haddad vem enfrentando resistência em sua tentativa de elevar a arrecadação e controlar o déficit fiscal. Lula, por sua vez, tenta blindá-lo politicamente, sinalizando que o governo tem direção – e que ela é diferente daquela adotada pela gestão anterior.

O futuro e o Mercosul: uma agenda ambiciosa

O presidente também aproveitou a ocasião para reforçar que pretende, durante sua presidência temporária no Mercosul, concluir o acordo comercial com a União Europeia — tratado que está há décadas em negociação e que se arrasta por entraves ambientais, tarifários e diplomáticos.

Em um trecho mais otimista do discurso, Lula mencionou projetos sociais que considera essenciais para mudar a realidade do país: a proposta de isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil e o programa Pé-de-Meia, que oferece incentivos a estudantes de baixa renda que permaneçam na escola.

O clima esquentou – e Lula sabe disso

Não foi um evento comum. Nem uma fala protocolar. Lula entrou em cena com os olhos voltados para 2026, mirando um eleitorado que já lhe foi hostil. Fez promessas concretas, mas também lançou farpas e deixou o ambiente político em alerta.

Num jogo de sombras e revelações, onde a disputa vai além da retórica, o recado foi claro: o presidente quer se reaproximar do agro — e, ao mesmo tempo, deixar seu antecessor isolado nas cordas da justiça.

A guerra de narrativas está lançada. E o campo, que antes parecia território dominado, agora vira campo de batalha.